Minha Carreira - O equívoco no termo - por Marcelo Veras

Minha Carreira

11 Novembro, 2019

"Competências comportamentais não têm nada de soft"

 

Sou engenheiro e sempre gostei muito de matemática. Sempre achei fácil entender e aprender tudo o que ela me apresentava. Aos 16 anos, já estava dando aula particular e ganhando uma graninha com a tal matemática. Dos 18 aos 22, dei aula em cursinho, também de matemática. Amei as disciplinas de cálculo no ciclo básico da engenharia. Enfim, sempre tive muita facilidade com essa disciplina que representava um verdadeiro terror para tanta gente. Já outros amigos eram muito bons em outras áreas: física, química, etc. Saí da faculdade com honra ao mérito e me achando o máximo. Sabia resolver equações, projetar equipamentos, resolver problemas de lógica e outras coisas mais. Vou arrebentar no mercado de trabalho!. "Sabe nada, inocente!".

No meu primeiro emprego após concluir a faculdade, como trainee, veio o choque de realidade. 90% do que tinha aprendido não me foi nem sequer cobrado na entrevista. E começou o meu inferno astral profissional. Fazia parte do programa ter que circular por todas as áreas, fazer relatórios de aprendizado, avaliar e ser avaliado pelos gestores das áreas que passava. Tinha até um caderninho para registrar tudo. O pesadelo começou quando li os critérios de avaliação. Comprometimento, empatia, relacionamento interpessoal, equilíbrio emocional, flexibilidade, entre outras coisas que eu simplesmente nunca tinha cogitado na época de faculdade, sendo que algumas delas eu não tinha nem ideia do real significado e para que diabos serviam. "Eu sou engenheiro" Por que raios estão me avaliando nessas coisas?". Aos poucos as fichas foram caindo na minha cabeça e comecei a entender o que eram e o tamanho da importância das competências comportamentais.

O tempo foi passando e logo logo percebi que o mundo do trabalho exige muito mais de nós competências comportamentais do que competências técnicas, principalmente quando começamos a trabalhar em equipe ou ter uma equipe para gerenciar. Me apaixonei pelo tema e, desde 2006, ele virou o meu objeto central de estudo e produção. Quando comecei a falar competências comportamentais em 2006, o tema ainda não estava em evidência como nos últimos anos. Hoje, não se fala de outra coisa.

Alguém que desconheço resolveu atribuir às competências socioemocionais o termo "soft skills". Traduzindo ao pé da letra, "soft" é leve e "skill" é competência. Como amamos aqui no Brasil usar termos em inglês, a coisa pegou. Imagino que quem criou o termo deve ter tido como motivação o fato de as competências emocionais serem mais humanas. Até entendo, mas não faz sentido algum.

Fácil é aprender matemática, equações ou analisar gráficos. Desenvolver comportamentos e atitudes não tem nada de fácil ou leve. É muito difícil. Exige muita energia, muita concentração e muita dedicação. Experimentei na pele e sei do que estou falando. Para mim, ter que desenvolver as tais competências comportamentais ao longo da minha carreira foi um desafio sobre-humano. Tive que, em primeiro lugar, me convencer de que era importante e que não iria muito longe sem elas. Depois, mais difícil ainda, foi ter que me concentrar muito para abandonar determinados padrões de comportamento e desenvolver novos. Garanto que, de soft, não teve nada.

Portanto, nas minhas aulas e palestras, tenho defendido que temos que parar de chamar as competências comportamentais de "soft skills" e passar a chamar de "hard skills". Basta inverter e fica tudo mais coerente, até porque, repito, desenvolver competências comportamentais não tem nada de soft. Até o próximo!